Transtorno do Espectro do Autismo: Um estudo epidemiológico no Norte de Minas Gerais
APRESENTAÇÃO
Tudo começou em maio de 2013, quando, em plena elaboração do projeto de pesquisa para o processo seletivo para entrada no doutorado, meu filho caçula, Sam, teve o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista (TEA). E agora, como fazer doutorado? Como continuar escrevendo o projeto? Não tinha como, pelo menos naquele momento, continuar os estudos. Apesar de não conhecer “nada” sobre o TEA, sabia, talvez por instinto materno, que a criança portadora desse transtorno tem muitas limitações e que o apoio da família seria fundamental para seu desenvolvimento.
Em meio ao processo de negação por ter perdido o “filho imaginário”, resolvi sair da fase de LUTO e ir à LUTA. Foi quando, em setembro desse mesmo ano, o Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde (PPGCS) abriu o edital para o processo seletivo. Então, vislumbrei a possibilidade de realizar meu doutorado, poder continuar estudando sobre o TEA e, além disso, desenvolver um projeto de pesquisa que ajudasse outras mães.
Porém, o desafio era grande. Eu precisava identificar no PPGCS um professor orientador que se interessasse por esse tema. Procurei a professora Marise Fagundes, que
me respondeu: “Claro que posso te dar uma carta de aceite, porém eu trabalho com projetos que envolvem análise estatística”. Respirei fundo, criei coragem e expliquei a ela minha situação - a de que somente poderia concorrer ao doutorado se pudesse desenvolver uma pesquisa sobre o TEA.
Acredito que por ela também ser mãe e conhecer meu trabalho, sensibilizou-se com minha história e pediu para eu escrever um projeto e enviar para análise. Assim o fiz e ela
aprovou a proposta. Com o projeto intitulado: “Prevalência do Transtorno do Espectro do Autismo em Crianças Matriculadas na Educação Infantil em Escolas da Rede Pública e Privada da Cidade de Montes Claros – Minas Gerais”, eu ingressei no doutorado.
Tratava-se de um projeto amplo e audacioso, que abordava um estudo de prevalência, um estudo de caso-controle e uma intervenção para gestores escolares, professores e pais. Para pleitear fomento, subdividimos em dois projetos: “Transtorno do Espectro do Autismo em crianças e adolescentes: um estudo de caso-controle na cidade de Montes Claros-MG” e “Transtorno do Espectro do Autismo: efeito de uma intervenção em pais e em profissionais da educação infantil”. Conseguimos financiamento pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG).
Definimos, então, desenvolver o estudo de caso-controle em meu doutorado e continuar o desenvolvimento dos demais em paralelo. Nesse estudo, propusemo-nos a comparar crianças e adolescentes com o TEA (grupo caso) com crianças e adolescentes neurotípicos, sem sinal do TEA (grupo controle) quanto às características demográficas e socioeconômicas dos pais, fatores pré-natais, eventos ocorridos no parto, fatores neonatais, fatores pós-natais e fatores familiares.
Esse estudo permitiu alcançar muitos resultados tanto de produção científica como formação de recursos humanos. No âmbito da pós-graduação, foram formados sete mestres, dois doutores e realizado um estágio de pós-doutorado. Foram publicados 11 artigos em revistas de renome nacional e internacional, 7 aceitos para publicações, 36 resumos simples ou expandidos, bem como 1 livro e 1 aplicativo.
Criamos, também, o Programa de Extensão, Ensino e Pesquisa sobre o Transtorno do Espectro do Autismo (SAMTEA) e institucionalizado pela Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes). Esse programa é formado por uma equipe multiprofissional, constituída por bióloga, bioestatística, farmacêutica, educadora física, fonoaudiólogas, odontólogas, psicopedagogas, neuropediatra, pedagoga, pediatra, matemática, e duas dessas são mães de criança com o TEA. Trata-se de um programa que vivencia a função da família, a clínica, a educação e a pesquisa. O programa SAMTEA estreitou parceria com a Associação Norte Mineira de Apoio ao Autista (ANDA), com a realização de consultorias, atendimento voluntário às pessoas cadastradas na associação, realização de cursos de formação para pais, educadores e gestores escolares, além de contribuição na elaboração, organização e realização de três congressos norte-mineiros sobre o TEA.
Ainda, com o objetivo de formar recursos humanos, realizamos, no primeiro semestre de 2017, uma capacitação para cerca de 700 professores da educação infantil do ensino regular de escolas públicas, filantrópicas e privadas da cidade de Montes Claros. O objetivo foi capacitar esses professores para identificar crianças com possíveis sinais do TEA no contexto escolar, e orientá-los para conduzi-las, junto aos pais e aos profissionais habilitados.
Embora não haja uma cura conhecida, o diagnóstico precoce e intervenção imediata podem
minimizar a cronificação do TEA.
Nesse e-book, buscamos compilar a trajetória desse projeto apresentando os resultados principais do estudo epidemiológico, os produtos alcançados e alguns textos que discutem importantes temas relacionados ao TEA. Esperamos contribuir com a ciência e incentivar o desenvolvimento de novas pesquisas sobre o Transtorno do Espectro do Autismo.
Fernanda Alves Maia
Fernanda Alves Maia
Marise Fagundes Silveira
Stéffany Lara Nunes Oliveira Araújo